domingo, 3 de outubro de 2010

Vossa Excelência chamou…? (3)

"Vossa Excelência Chamou", Livros Horizonte, Lisboa, 2.ª ed. 2008
Autor e Ilustrações: Júlio Borja

Tudo o que possa ter interesse saber-se sobre aquisição, manutenção, reparação, calibragem, upgrade e tuning de gatos domésticos.

O meu gato será um gato a sério? (Para quem já tem - ou julga ter - gato)

[…] O que acontece nos tempos que correm, com os avanços das biotecnologias alternativas, os alimentos geneticamente modificados, as asquerosas bebidas light, a clonagem desenfreada, mais o abuso generalizado de esteróides anabolizantes e o visionamento regular de reality shows na TV... é que já ninguém pode ter a certeza absoluta de quem é o quê - mesmo dentro da sua própria casa. […] Com os gatos passa-se a mesma coisa: há quem compre (adopte, herde, recolha da rua) lebre por gato - e é preciso estar-se de sobreaviso. Para além do mais, há que ter presente que o que hoje por aí há mais são bicharocos que, sendo até "de origem", são perfeitamente confundíveis com um gato: cães de companhia de senhoras, tipo bibelot - histéricos, enfezados, amaricados, com laçarotes na cabeça e cheios de tremores - são o caso mais típico, mas também servem de exemplo certas personagens (alegadamente) masculinas da fauna do jet set (humano) nacional, as quais podem perfeitamente passar por gatas com cio, se as apanharmos de vison pelas costas, maquilhagem na cara e com os calores abichanados de antevéspera de vernissage...[…]

[…] em relação à autenticidade gatal do inefável quadrúpede que arranjou para entreter o agregado, será que tem mesmo um gato? Será verdadeiramente gato?[…]

[…] Coloque-se frente ao candidato e chame o bicho pelo nome. Se não houver reacção claramente perceptível, olhe o danadinho bem nos olhos e repita o chamamento passados 10 segundos. Se, ainda assim, o bicho não lhe ligar pevide, chame-lhe outras coisas, variando o mais possível, para tentar baralhá-lo e captar-lhe a atenção.
[…] Se o animal continuar a olhar para si com uma expressão vazia e desinteressada, isso é muito bom sinal: pelo menos, cão não é, de certeza, nem mesmo dos tais pequeninos e amaricados. Todos os cães respondem sempre mesmo quando não os chamamos, basta espirrarmos ou gritarmos "Golo!",[…] que o alarve vem logo todo contente, a babar-se de subserviência, com o fiambre a pingar-lhe da boca e a expressão eufórica de quem acaba de ganhar uma viagem às Seychelles para dois, o dono e ele![…]

[…] Imediatamente após o seu bicho ter feito o cocozinho da praxe na areia da caixa das necessidades, aproxime-se da mesma munido de um balde. Abra a portinhola por onde o animal entra e sai da caixa, chegue o nariz bem junto à entrada e inspire uma vez. Se as notícias forem boas e o seu gato for um gato a sério, o prezado leitor dará por si numa agonia auschwitziana, a vomitar convulsivamente para dentro do tal balde, abalado e tonto, mas já ciente de que não comprou lebre por gato. Cocó de gato, de verdadeiro gato, é algo que deita um cheiro só suportável por quem nasceu para amar gatos acima de Deus e da sua própria vida. […]

[…] Há comportamentos-tipo que o gato costuma ter, com regularidade. Afiar as unhas em sítios inconvenientes. Vomitar ocasionalmente bolas de pêlo acompanhado de sons estrebuchantes. Lamber diária e demoradamente as suas próprias partes baixas, de olhos cerrados. Fazer slalom entre as pernas do dono quando lhe cheira que está com hipóteses de lhe cravar uma ponta de bife, em alternativa às repetitivas e politicamente correctas latinhas de comida para gato. Tratar qualquer gato estranho à casa que tenha o azar de lá entrar com o mesmo afecto e consideração com que um judeu ultra-ortodoxo trataria um primo direito do Yasser Arafat, se aquele lhe entrasse pela casa adentro no Domingo de Páscoa, a tentar convencer-lhe o filho a passar as férias de Verão num campo de recrutamento para operacionais da OLP.
Se o seu bicho tem, regularmente, comportamentos-tipo, ficou aprovado enquanto gato completamente legítimo, com tudo no sítio e certificado de garantia.[…]

4 comentários:

Livros Horizonte disse...

Cara Leitora,

Ficamos genuinamente satisfeitos que aprecie o livro do nosso autor Júlio Borja e que queira dar a conhecer aos leitores esta obra sob a forma da mostra de alguns excertos. Não podemos, contudo, como compreenderá, deixar de lhe solicitar que atribua a devida referência bibliográfica ("Vossa Excelência Chamou", Livros Horizonte, Lisboa, 2.ª ed. 2008.) aos excertos e o copyright à imagem (direitos reservados) que disponibilizou, e que assinale sob a forma de reticências [...] os cortes de que estes foram alvos.
Ficamos sempre gratos aos leitores que divulguem as nossas obras mas pedimos, à luz dos Direitos de Autor, alguma moderação e a atribuição das devidas referências.

Obrigado e continuação de boas leituras!

Livros Horizonte

Pezinhos na Areia disse...

Peço desculpa pelas faltas cometidas, embora não tenham sido intencionais. O não cumprimento, na aplicação da totalidade das regras, deve-se a uma ingenuidade da minha parte. Julguei que seria suficiente dar a conhecer o nome do livro e o autor. Mais uma vez peço desculpa pelo desrespeito das normas, agradecendo os vossos esclarecimentos e compreensão.

Boas leituras, sempre!

Pezinhos na Areia disse...

Conforme solicitado, fiz as devidas referências nos 3 "post" que se referiam a este livro. Gostaria de saber se agora está tudo legal visto que fiquei com dúvidas em relação à imagem.
Obrigada.

Livros Horizonte disse...

Cara Leitora,

Ficamos gratos pela sua compreensão e por ter indicado as devidas referências.

Boas leituras!

Livros Horizonte