quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Retalhos da Vida

Visito a minha mãe com assiduidade. Encontro-a, quase sempre, muito pensativa, com um ar abatido e com uma carinha triste. Hoje, notava-se que tinha chorado… e pela primeira vez, desde que o meu pai faleceu, falou dele com mágoa e muita saudade. Disse-me que, apesar de nos últimos meses ele estar acamado e lhe ter dado trabalho, fazia-lhe companhia… Sente falta da sua presença e, à noite, a solidão aperta…
Tentei, com dificuldade, dar a volta ao assunto. Penso que não me saí bem. As lágrimas já estavam prontas a saltar quando fui salva pelo toque da campainha. Era a minha filha R. e enquanto ela lanchou, junto da minha mãe, procurei refúgio no único lugar da casa que permanece inviolável, como se fosse um lugar proibido ou sagrado, o escritório do meu pai…
Sentei-me na mesma cadeira onde tantas vezes o vi sentado. Durante uns segundos pareceu-me que estava a violar a sua privacidade, a perturbar a sua intimidade. Fiquei ali, no silêncio dos livros e dos papéis, à espera que as lágrimas teimosas desistissem de correr…

Quando saí e olhei para trás, visualizei-o com o seu sorriso terno e a sempre enorme satisfação por me ver. Mas, não passou de um devaneio. A cadeira continuava lá, desocupada… e no escritório reinava o vazio, tal como no meu coração reinava o sentimento de perda…

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