segunda-feira, 2 de maio de 2011

Memórias e Afectos (78)

Continuação do “post” Memórias e Afectos (76)

Por lapso, na primeira parte destas memórias liceais, não fiz alusão a um acontecimento nefasto que levou o luto ao liceu, pouco tempo depois de termos iniciado o 1º período. Na noite de 25 para 26 de Novembro de 1967 choveu intensamente na região de Lisboa, principalmente nas zonas baixas da capital e nas zonas de Odivelas, Loures, Vila Franca de Xira e Alenquer. Nas cheias de 67 morreram centenas de pessoas, houve milhares de desalojados e prejuízos incalculáveis. Foi um caos. O regime, preocupado em abafar a extensão da tragédia, que denunciava explicitamente a miséria em que vivia uma grande parte da população da área de Lisboa, impediu, através da censura, que o povo tivesse noção da verdadeira realidade. Através dos jornais da época, podemos confirmar a marca evidente da censura que se empenhou na distorção do número de vítimas.

Foi nesta noite trágica que desmoronou um prédio em Queluz, situado junto aos arcos e rente à ribeira do Jamor. A estrutura foi levada pela corrente. Várias pessoas afogadas, entre elas, uma colega do liceu que vivia nesse edifício. Naquela noite, a enxurrada de lama levou consigo os sonhos de uma menina de onze anos. Foi angustiante continuar a passar diariamente por aquele local e ver um cenário de destruição, mas não havia alternativa, só havia aquele caminho. Ainda hoje são visíveis restos do prédio, obstinadamente agarrados ao prédio contíguo, como se, naquela noite, tivesse tentado que o outro lhe “deitasse a mão”… As cheias de 67 fizeram muitas vítimas, mas, na minha ainda tenra idade, o que me transtornou, o que me chocou sinceramente, o que me causou angústia e sonhos aflitivos, foi a morte estúpida, anormal e absurda da Cecília…

(continua)

(imagens roubadas “gentilmente” na Net)

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