domingo, 16 de junho de 2013

Livros e Mar: eis o meu elemento! (75)

Maria Filomena Mónica publicou, em 2005, a sua autobiografia ‘Bilhete de Identidade’, que pôs a nu uma vida intensa e cheia de convicções. Foi sempre da opinião que homens e mulheres têm direitos iguais.

Como era de esperar, em “Bilhete de Identidade”, Maria Filomena Mónica conta tudo e, como sabemos, ela é rebelde, descomplexada, destemida, sem preconceitos, sendo mesmo, às vezes, presumida e arrogante, adjectivos que suscitam opiniões muito díspares e algumas pouco agradáveis. Com Maria Filomena Mónica não há meio-termo, ou se gosta ou se detesta e eu encontro-me entre os primeiros.
Se já sentia admiração por ela, particularmente porque ela é tudo o que eu, lamentavelmente, não sou, a leitura desta obra autobiográfica, deixou-me completamente rendida. MFM conta a sua história de vida sem rodeios e lutou pela sua emancipação, numa época em que a mulher tinha um papel passivo e secundário na sociedade, numa época em que o Estado Novo tinha criado uma imagem da mulher idealizada pela moral e pela religião, numa época em que trabalhar fora do lar era uma ameaça à estabilidade familiar.
Em “Bilhete de Identidade”, Maria Filomena Mónica recorreu a diários e cartas que tinha guardado e a documentos que encontrou. Não se resguardou das críticas, não se preocupou com o seu estatuto social, nem ocultou os podres da família, como, por exemplo, que a mãe era filha ilegítima…
Como socióloga e investigadora, descreve, numa brilhante sucessão temporal de factos, os fenómenos sociais durante os regimes de Salazar e Caetano e após a revolução do 25 de Abril.
Uma autobiografia singular de uma mulher admirável.

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Num país sem tradição memorialista, no qual as poucas obras que existem representam a justificação de acções pretéritas, Maria Filomena Mónica procura apresentar a sua vida sem glorificações nem lamúrias. Não presume fornecer a verdade, mas apenas a sua verdade: outros terão olhado as pessoas, os acontecimentos e as peripécias, de que aqui nos fala, de forma diferente. Num país conservador, católico e hipócrita, o tom cru deste livro poderá chocar. Mas a intenção da autora não foi essa, mas sim a de tentar perceber, e dar a perceber, uma vida, uma família e um país, entre 1902, data do nascimento da sua avó, e 1976, o ano em que, após uma estadia no estrangeiro, regressou a Portugal.

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