Recordo, saudosa e tristonha, as tardes de domingo da minha infância. O meu pai ia todos os domingos visitar os meus avós, que, na época, moravam numa moradia na Rua da Milharada, em Massamá, onde actualmente existe um condomínio da empresa de construção civil Pimenta e Rendeiro. O meu avô paterno J.J., de quem já tive oportunidade de falar aqui, habitava com a minha avó L. numa vivenda, que ainda existe, quase à beira da estrada, com duas grandes palmeiras e um coreto, em Queluz de Baixo. A casa era muito bonita, mas por qualquer razão que desconheço, resolveram mudar-se para Massamá…
Tenho presente na minha memória toda a disposição da casa, do jardim e do quintal e felizmente que assim é pois não existem fotografias da mesma. Os meus avós habitavam o primeiro andar. Depois de aberto o portão, a entrada, para familiares e amigos, fazia-se sempre pelas traseiras, por uma escada que dava acesso imediato à cozinha. A entrada pelo lado frontal fazia-se por uma escadaria que partia do jardim, sempre florido (lembro-me particularmente das dálias…), entrando num pequeno hall de onde partia uma escada de madeira para o sótão, com uma porta rematada com vitrais coloridos. Desse átrio passava-se ao corredor, com divisões de ambos os lados, que terminava na sala. Da sala podíamos passar à cozinha e descer ao quintal. A casa de banho era enorme, quase tão grande como a sala e, certamente, maior do que os quartos…
O andar de baixo estava alugado. O meu avô, sempre com olho para o negócio e porque não necessitava de ocupar toda a moradia, alugou o rés-do-chão. Ao fundo do quintal habitavam os caseiros. Julgo que não pagavam renda, mas tratavam da horta e das capoeiras ainda que não fizessem desse trabalho modo de vida. Ao fundo da propriedade, para lá de um pequeno portão, podia ver-se uma ribeira, que “teima” em continuar a passar rigorosamente no mesmo sítio, mas sem o aspecto sombrio que tinha quando se ocultava no caniçal…
Recordo, saudosa e tristonha, as tardes de domingo da minha infância. Cumprimentados os meus avós e uma prima direita do meu avô que com eles vivia, olhava intrigada para o cenário invariável da sala e para os seus singulares ocupantes. A prima do meu avô e a minha avó, sentadas à mesa oval, viam televisão, enquanto um gato preto dormitava aos seus pés. O meu avô descansava no seu cadeirão, junto à janela, devidamente escudado por um modesto biombo, que, segundo ele, o resguardava de correntes de ar. Domingo após domingo, a cena e os personagens permaneciam no estado em que os tinha encontrado na semana anterior, inalteráveis, como se aquela sala, imutável, tivesse parado no tempo…Recordo, saudosa e tristonha, as tardes de domingo da minha infância. Depois de confirmar que tudo estava inalterado, corria para o quintal à procura de companhia da minha idade. Geralmente, os filhos dos caseiros andavam por ali e com eles brincava e explorava o quintal. Quando não os encontrava, ocupava o tempo junto ao tanque abastecido de água pelo moinho metálico de vento, sem compreender o seu funcionamento, mas maravilhada pela sua eficácia. Ali ficava, perdida nos meus rudimentares pensamentos infantis, olhando as pás que se moviam ora depressa, ora devagar, até o meu pai me chamar.
Recordo, saudosa e tristonha, as tardes de domingo da minha infância. Tardes simultaneamente rotineiras e divertidas…
sábado, 3 de dezembro de 2011
Memórias e Afectos (88)
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