O ano de 1918 é um momento decisivo para a afirmação das ciências forenses em Portugal. É o ano da criação dos institutos de medicina legal de Lisboa, Porto e Coimbra. É o ano da criação da Polícia de Investigação Criminal ― suportada por laboratórios e produzindo prova com fundamentação científica. É o ano da tragédia de La Lys e, também, do Armistício que conduziu ao fim da Primeira Guerra Mundial. É o ano da “espanhola”, a pandemia gripal influenza pneumonica que surge, no Portugal republicano, fragilizado e faminto, e que se transformou num verdadeiro desastre de massas que terá morto mais de cem mil pessoas. Uma matança que ocorreu durante quatro meses. Sabendo-se que era um vírus (só muitos anos mais tarde identificado por H1N1) que matou a eito, sobretudo entre os grupos etários mais jovens, desaparecendo sem deixar rasto. É, ainda, o ano do consulado sidonista.
O assassínio do Presidente da República Sidónio Pais, ocorrido em 1918, é um mistério. Apesar de a polícia ter prendido um suspeito, este nunca foi julgado.
A Polícia, desde o tiro fatal, confundira todos, prendendo a eito, torturando, precipitando resultados. A Maçonaria queria vê-lo destruído, a Carbonária talvez o quisesse desfeito em migalhas, os católicos queriam mais do que o espavento das missas em que o Presidente participava, os integralistas exigiam uma política de ruptura, os democratas odiavam-no.
É neste quadro de ódios que Moita Flores reconstrói o homicídio, utilizando técnicas forenses, fundamentado em documentos da época e num documento decisivo que é, nem mais nem menos, a autópsia do Presidente da República, Sidónio Pais.
Tornou-se uma verdade indesmentível e absoluta que o então Presidente da República foi assassinado por José Júlio da Costa. Uma verdade policial que, desde a consumação do crime, lhe apontou o dedo; uma verdade jornalística na medida em que foi unânime a crença de que não teria sido outro o criminoso. Mas existem outras verdades por afinar. A primeira delas é que José Júlio da Costa nunca foi julgado. Não foi José Júlio da Costa quem matou Sidónio Pais. Nem uma única das suas contraditórias confissões é compatível com os resultados dos exames forenses realizados por Asdrúbal d’Aguiar, um dos mais proeminentes médicos legistas portugueses dos inícios do século XX.
Seguimos o grito experimentalista de Bichat, lançado nos inícios do século XIX, pedindo que deixássemos os cadáveres falarem. Na verdade, confessam evidências que foram invisíveis para os vivos. Permitam-me descobrir um dos segredos mais bem guardados do Presidente mais amado pelas mulheres de Lisboa, e que a sua autópsia revelou. O cabelo penteado num movimento para a testa, brilhante, quase envernizado, terminando nuns caracóis displicentes que casavam na perfeição com o bigode recurvado em pontas trabalhadas, disfarçava uma calvície generosa, cuja apoteose era um enorme quisto sebáceo na confluência articular dos parietais com o frontal.
Os cadáveres são mais verdadeiros nas suas confissões do que alguma vez qualquer vivo conseguirá, por maior que seja a sua boa-fé.
O assassínio do Presidente da República Sidónio Pais, ocorrido em 1918, é um mistério. Apesar de a polícia ter prendido um suspeito, este nunca foi julgado.
A Polícia, desde o tiro fatal, confundira todos, prendendo a eito, torturando, precipitando resultados. A Maçonaria queria vê-lo destruído, a Carbonária talvez o quisesse desfeito em migalhas, os católicos queriam mais do que o espavento das missas em que o Presidente participava, os integralistas exigiam uma política de ruptura, os democratas odiavam-no.
É neste quadro de ódios que Moita Flores reconstrói o homicídio, utilizando técnicas forenses, fundamentado em documentos da época e num documento decisivo que é, nem mais nem menos, a autópsia do Presidente da República, Sidónio Pais.
Tornou-se uma verdade indesmentível e absoluta que o então Presidente da República foi assassinado por José Júlio da Costa. Uma verdade policial que, desde a consumação do crime, lhe apontou o dedo; uma verdade jornalística na medida em que foi unânime a crença de que não teria sido outro o criminoso. Mas existem outras verdades por afinar. A primeira delas é que José Júlio da Costa nunca foi julgado. Não foi José Júlio da Costa quem matou Sidónio Pais. Nem uma única das suas contraditórias confissões é compatível com os resultados dos exames forenses realizados por Asdrúbal d’Aguiar, um dos mais proeminentes médicos legistas portugueses dos inícios do século XX.
Seguimos o grito experimentalista de Bichat, lançado nos inícios do século XIX, pedindo que deixássemos os cadáveres falarem. Na verdade, confessam evidências que foram invisíveis para os vivos. Permitam-me descobrir um dos segredos mais bem guardados do Presidente mais amado pelas mulheres de Lisboa, e que a sua autópsia revelou. O cabelo penteado num movimento para a testa, brilhante, quase envernizado, terminando nuns caracóis displicentes que casavam na perfeição com o bigode recurvado em pontas trabalhadas, disfarçava uma calvície generosa, cuja apoteose era um enorme quisto sebáceo na confluência articular dos parietais com o frontal.
Os cadáveres são mais verdadeiros nas suas confissões do que alguma vez qualquer vivo conseguirá, por maior que seja a sua boa-fé.
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