quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Afinal, o que é a inteligência?

(tradução livre do original “What is inteligence,anyway?”)
Isaac Asimov (1920-1992, físico e bioquímico russo, naturalizado americano, autor de obras de ficção e divulgação científicas)


Quando eu estava no exército, fiz um teste de aptidão, solicitado a todos os soldados, e obtive 160 pontos. A média era 100. Ninguém na base tinha visto uma nota destas e durante duas horas fui o assunto principal das conversas. Não significou nada – no dia seguinte eu ainda era um soldado raso.
Durante toda a minha vida consegui notas como esta, o que sempre me deu uma ideia de que era realmente muito inteligente. E imaginava que as outras pessoas também achavam isso.
Porém, na verdade, será que essas notas não significam apenas que sou muito bom para responder a um tipo específico de perguntas académicas, consideradas pertinentes pelas pessoas que formularam esses testes de inteligência, e que provavelmente têm uma habilidade intelectual parecida com a minha?
Por exemplo, eu conhecia um mecânico que jamais conseguiria passar num teste destes, acho que não chegaria aos 80 pontos. Portanto, sempre me considerei muito mais inteligente do que ele. Mas, quando acontecia alguma coisa ao meu carro e eu precisava de alguém para dar um jeito, era a ele que eu me dirigia. Observava como ele investigava a situação enquanto fazia os seus pronunciamentos sábios e profundos, como se fossem oráculos divinos. No fim, sempre era ele quem consertava o meu carro. Então imagine se esses testes de inteligência fossem preparados pelo meu mecânico. Ou por um carpinteiro ou qualquer outro que não fosse um académico.
Em qualquer desses testes eu comprovaria a minha total ignorância e estupidez.
Na verdade, seria mesmo considerado um ignorante, um estúpido.
Num mundo onde não pudesse valer-me do meu treino académico ou do meu talento com as palavras e tivesse de fazer algum trabalho com as mãos, dar-me-ia muito mal. A minha inteligência, portanto, não é algo absoluto mas sim algo imposto como tal, por uma pequena parcela da sociedade em que vivo.
Vamos considerar o meu mecânico, mais uma vez. Ele adorava contar piadas. Certa vez levantou a cabeça por cima do capô do meu carro e perguntou-me:
- Doutor, um surdo-mudo entrou numa loja de ferragens para comprar uns pregos. Colocou dois dedos no balcão como se estivesse a segurar um prego invisível e com a outra mão imitou umas marteladas. O empregado da loja trouxe um martelo. Ele balançou a cabeça de um lado para o outro negativamente e apontou para os dedos no balcão. Dessa vez o empregado trouxe vários pregos, ele escolheu o tamanho que queria, pagou e foi-se embora. O cliente seguinte era um cego, queria comprar uma tesoura. Como acha que ele fez?
Eu levantei a minha mão e “cortei o ar” com dois dedos, como uma tesoura.
- O Dr. é muito burro mesmo! O cego simplesmente abriu a boca e usou a voz para pedir!
Enquanto o meu mecânico ria à gargalhada, comentou:
- Estou a fazer esta adivinha a todos os clientes hoje!
- E muitos caíram? Perguntei esperançoso.
- Alguns. Mas consigo eu tinha a certeza absoluta que ia funcionar.
- Ah é? Porquê?
- Porque eu acho que o doutor tem muitos estudos, mas não é lá muito esperto.
E algo dentro de mim me dizia que ele tinha alguma razão nisto tudo...

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